Ah, as férias de verão!
Poucas pessoas tinham esperado tanto pelas férias este ano quanto o Zeca.
Na faculdade o semestre foi um desastre. Notas terríveis, brigas com o professor de redação que quase lhe custaram a nota final, sem falar na participação vergonhosa no campeonato interno de futebol, fiasco total.
Em relação ao namoro a coisa também não andava bem. A relação com a Aninha estava muito sem graça, e o Zeca até desconfiava que ela o estava traindo com um rapazinho do curso de ADM, porém como ele não tinha certeza ia deixando o tempo passar.
Mas pra ele isso tudo já fazia parte do passado. Zeca olhava à sua volta e ficava mais feliz a cada minuto que passava. Lá estava ele com sua inseparável mochila esperando o ônibus sair para finalmente poder relaxar.
Zeca estava indo se encontrar com seus grandes amigos da ESPM, o Rico e o Tetê, que já estavam há alguns dias na casa do Bento, em Lins. Aquela cidade era uma maravilha, e todos eles tinham dezenas de histórias pra contar de suas aventuras por lá. Nem bem o ônibus ia saindo da rodoviária e um sorriso já ia se formando, devagarzinho, na expectativa dos dias que estavam por vir.
A viagem estava super tranqüila, e ao chegar ao Rodoserv o Zeca ligou pra Lins pra avisar a hora prevista de chegada e pedir pra alguém pegá-lo na rodoviária. Foi o Rico que atendeu, e ele passou a dica do lanche mais espetacular das estradas brasileiras: o X-Calabresa. O Zeca foi babando do orelhão até o balcão da lanchonete, e realmente a dica do Rico valia ouro, pois o sanduba era uma maravilha.
Alguém de vocês já viajou pela Castelo em dezembro, com o sol a pino, em ônibus regular requebrando mais que mulata na avenida? Agora imaginem isso tudo com um tremendo X-Calabresa fermentando dentro de você. Imaginem o Zeca.
No começo ele achou que não era nada, que estava um pouco enjoado porque tinha comido muito rápido. Até a primeira vez que ele precisou ir ao banheiro no fundo do ônibus. Chamar aquilo de banheiro era um exagero, aquele espaço era mais uma sauna em forma de cubo com um mini vaso sanitário no canto. Mas fazer o que, era a única saída naquele momento.
Entre levantar da sua poltrona e sentar no trono foram alguns segundos apenas, mas para o Zeca deu tempo de ver sua vida toda passando frente aos seus olhos. Sua barriga borbulhava tanto que ele achou que ia sair um alien de lá, haja correria pelo corredor!
E na hora de sair do banheiro? Todo mundo olhando e comentando, teve uma senhora que até mudou de lugar. Ele não percebeu, mas pelo visto sua passagem pelo troninho foi, além de tudo, barulhenta. Que vexame…
Zeca voltou encabulado ao seu lugar, pensando que pelo menos agora tudo ficaria bem.
E ficou mesmo, pelo menos até chegar a Botucatu. Dá-lhe correria pro fundo do ônibus de novo, e a senhora que tinha mudado de lugar até se benzeu ao ver o Zeca passando por ela.
O coitado não sabia o que fazer. Praguejou contra o calor, contra a calabresa, contra o chapeiro que preparou o sanduíche, contra o Rico que deu a dica, contra o motorista que dirigia devagar demais, era o fim do mundo pra ele.
Mas fim do mundo foi mesmo quando ele apertou a descarga e nada aconteceu. Aperta uma vez, aperta duas, e nada. Silêncio absoluto e tudo parado. Menos o ônibus, que não parava de balançar. O Zeca fechou a porta e foi falar com o motorista.
– Dá licença?
– Moço, é proibido falar com o motorista.
– Eu sei, mas é que eu acho que a descarga do banheiro quebrou.
– Não tem problema, daqui a duas horinhas já estamos em Lins, o pessoal segura.
– O senhor não está entendendo. Tem um monstro de calabresa lá dentro que não consigo fazer descer encanamento abaixo, daqui a pouco este veículo todo estará empestado!
Zeca descobriu naquele momento seu dom de prever o futuro, pois em menos de quinze minutos ficou impossível se respirar lá dentro. Alguns passageiros queriam até bater no coitado, mas ele não tinha culpa, ele era o sofredor número 1 daquele dia.
E como miséria pouca é bobagem, lá veio aquele remelexo na barriga de novo. A dor piorando. O suor escorrendo. A privada entupida. A descarga quebrada.
– Pelamordedeus, pára esse busão!!!!
E lá foi o Zeca pro acostamento, com 40 pessoas vaiando atrás dele.
E lá foi o Zeca de novo, meia hora depois.
E de novo, tendo que entrar em Bauru pro motorista pegar mais papel higiênico no posto Sem Limites.
O Zeca achou que ia morrer. Ou de diarréia ou de espancamento, pois ele fez o motorista parar a cada meia hora pra se esvaziar na beira da estrada.
A última parada foi perto de Getulina. Ele sabia que estavam muito perto de Lins, mas não deu pra agüentar. O lado bom é que todos tiveram a chance de conhecer a rodoviária da cidade, quando esse povo ia ter a chance de entrar em Getulina de novo?
Quase 7 horas depois de sair de São Paulo eles chegaram ao destino. As pessoas estavam preocupadas, pois a previsão era deles estarem lá pelo menos duas horas atrás.
Agora tudo ia ficar bem. Um bom banho e cama. A paz estava voltando ao coração do Zeca até o Rico chegar:
– Cara, tá tudo bem? Você tá meio pálido…
Ricardo Anbar
ricardo@maemequer.com
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